sábado, maio 23, 2015

"Mariquinha, vai se vestir!"

Foto por: Chris Arruda


Ela ouvia, fazia cara de quem nem se importava. Era isso: Ser independente de qualquer limitação. Morre, na minha cidade, "a louca". Quantas vezes ouvi essa expressão e usei como quem divide o mundo entre os normais e os loucos? Lembro que certa vez discuti sobre a nudez de Mariquinha. Fiquei vendo os olhos na mesa cheios de vontade de limitar, regrar, problematizar. Pouco sabem que a nudez de Mariquinha é a de quem não sabe mais, porque esqueceu que um dia foi ensinada que nudez é proibida. E louca não sou eu que ando vestida sem querer estar? Loucos não somos nós que acordamos todos os dias sem querer acordar, comemos o que não queremos comer? Vivemos incompletos, insatisfeitos, buscando qualquer coisa que não sabemos o que é, mas que se afigura com um buraco enorme no peito. A gente faz um esforço danado pra ser livre, e esquece que a liberdade está em saber ser sem dificuldade. Mariquinha foi-se embora como era: sem dor. Sem medo. Perto de Deus. Tão perto de Deus e tão singular que faz as pessoas rirem diante da morte. Tão livre que não coube nesse mundo pequeno.